O uso da Falácia do Espantalho no discurso do atual presidente dos EUA, Donald Trump

A falácia do espantalho é uma das técnicas argumentativas mais comuns em discursos políticos, debates e discussões públicas. Esse erro lógico ocorre quando alguém distorce a posição do oponente, tornando-a mais fácil de refutar. Embora possa ser um erro lógico, muitas vezes as pessoas a utilizam por estratégia argumentativa. Ou seja, em vez de enfrentarem o argumento real, cria-se uma versão exagerada, simplificada ou falsa dele, que então é atacada.Vou falar a respeito da falácia do espantalho em profundidade, com foco no caso recente envolvendo Donald Trump e suas declarações sobre o acidente aéreo nos EUA.

Acredito que pegar um caso mais próximo possa elucidar o entendimento mais razoável de como essa falácia pode ser utilizada. Lembrando que os exemplos são criações que não necessariamente corresponde com o real pensamento dos personagens citados. Qualquer semelhança talvez seja mera coincidência, ou não.

O Que é a Falácia do Espantalho?

A falácia do espantalho ocorre quando:

  • Um argumento original é distorcido ou exagerado.

  • A versão distorcida é atacada, não o argumento real.

  • O debate se desloca do tema principal para a refutação de uma posição que ninguém realmente defendeu.

Essa técnica é usada para manipular a opinião pública e desacreditar adversários sem responder aos pontos reais levantados.

Exemplo Real: O Caso Trump e a Crise na Aviação

Recentemente, Donald Trump fez algumas declarações após a colisão de um avião comercial e um helicóptero militar nos EUA, atribuindo a responsabilidade do acidente a políticas de diversidade promovidas por governos democratas anteriores. Essa afirmação exemplifica a falácia do espantalho de diversas maneiras:

  1. Distorção da Política de Diversidade:

    • Trump afirmou que a inclusão de profissionais diversos no setor aéreo levou à contratação de pessoas “abaixo da qualificação exigida”, insinuando que critérios como competência foram ignorados.

    • Na realidade, políticas de diversidade visam ampliar oportunidades para grupos historicamente excluídos sem abrir mão de qualificação.

    • Trump criou um espantalho ao sugerir que a diversidade significa “contratar pessoas sem competência”, que de maneira nenhuma é o foco real do problema.

  2. Ataque a Obama e Biden Baseado em Premissas Falsas:

    • Trump disse que Obama contratou “pessoas com deficiências intelectuais” para a aviação, algo sem qualquer evidência.

    • Ele ignorou as regulações do setor, que exigem certificações rigorosas para funções críticas.

    • Esse argumento coloca um espantalho na política democrata para torná-la mais fácil de criticar.

  3. Desvio do Debate sobre a Verdadeira Causa do Acidente:

    • Trump sugeriu que políticas de diversidade causaram a colisão, sem apresentar qualquer evidência.

    • Ele desviou a discussão das investigações técnicas sobre falhas de comunicação ou problemas mecânicos.

    • A estratégia foi mudar o foco do problema real para uma questão política polarizadora.

No caso, o foco principal que está sendo desviado é a real causa do acidente entre o avião e o helicóptero. Em vez de aguardar investigações técnicas para determinar os fatores envolvidos—como falha mecânica, erro humano ou problemas no controle de tráfego aéreo—Trump utiliza a tragédia para atacar políticas de diversidade e inclusão, sugerindo que a queda foi resultado dessas políticas, sem apresentar qualquer evidência concreta. Esse desvio serve para transformar um problema específico (um acidente aéreo) em uma narrativa política mais ampla, desviando a atenção das reais questões de segurança e regulação da aviação.

A estrutura desta falácia do espantalho segue três etapas principais:

  1. Deturpação do argumento original – O emissor cria uma versão distorcida e simplificada do argumento original. No caso de Trump, ele transforma políticas de diversidade e inclusão em uma falsa premissa de que elas levam à contratação de profissionais incompetentes.

  2. Ataque à versão deturpada – Em seguida, ele critica essa versão distorcida em vez do argumento real. Ele sugere que o problema na aviação é causado por políticas de inclusão, desviando a atenção das verdadeiras causas do acidente.

  3. Conclusão baseada na falácia – Por fim, ele apresenta uma solução para um problema que ele mesmo inventou, como a necessidade de “reformar” a aviação eliminando políticas de diversidade, sem fornecer provas de que essas políticas de fato contribuíram para o acidente.

A eficácia da falácia do espantalho

Por aqui é possível ver o quão eficaz é esta falácia, pois direciona o debate para uma questão falsa, impedindo uma discussão racional sobre o problema real.

A falácia do espantalho é particularmente eficaz quando o público-alvo não recebe um contraponto direto ou não tem acesso a informações que desmontem a distorção apresentada. Isso ocorre porque, sem uma refutação clara, a versão distorcida do argumento pode parecer convincente e ser aceita como verdade. Ou seja, em não havendo alguém para apontar que houve uma deturpação, as pessoas tendem a não prestar atenção ao foco principal.

Em ambientes como redes sociais, televisão ou manchetes de jornais, onde as pessoas consomem informações de forma rápida e superficial, a falácia do espantalho pode ser extremamente persuasiva. O público, ao não investigar mais a fundo o que foi realmente dito ou a validade das acusações, tende a formar opiniões baseadas na versão manipulada da questão.

No caso específico da notícia sobre Trump, ao associar políticas de diversidade à queda da qualidade na aviação, ele cria uma falsa relação de causa e efeito e desvia a atenção do que realmente poderia ter causado o acidente. Como a maioria das pessoas não tem tempo ou interesse em buscar dados concretos sobre a segurança na aviação, a afirmação ganha força e se espalha sem ser devidamente contestada.

 

Relação da Falácia do Espantalho com Outras Falácias

No discurso de Trump, há uma combinação estratégica de duas falácias: a falácia da falsa causa e a falácia do espantalho

Primeiro, ele utiliza a falsa causa ao sugerir que políticas de diversidade e inclusão foram responsáveis pelo acidente aéreo. Ele estabelece uma relação de causa e efeito sem qualquer evidência concreta, apenas com base em sua “intuição” e “senso comum”. Esse é um clássico exemplo de post hoc ergo propter hoc, onde a mera coexistência de dois eventos é apresentada como se um fosse a causa do outro.

Com essa falsa relação estabelecida, Trump constrói um espantalho, deturpando a questão real da segurança na aviação para direcionar a culpa a políticas progressistas de diversidade. Em vez de discutir fatores técnicos, erros humanos específicos ou falhas sistêmicas no setor, ele simplifica o problema e ataca uma versão distorcida do argumento: a de que democratas contrataram “pessoas com deficiências intelectuais” para funções críticas da aviação. 

Essa alegação não apenas não foi feita por ninguém, como também serve para desviar o foco das reais causas do acidente.

Dessa forma, a falácia da falsa causa cria um cenário artificial de culpa, e o espantalho utiliza essa premissa falsa para desviar a atenção e atacar uma posição que ninguém realmente defendeu. 

O resultado é um discurso manipulador que impacta um público amplo, especialmente aqueles que não têm acesso ou interesse em um contraponto qualificado. Sem contar que, por ser uma das nações mais influentes do mundo e, portanto, Trump sendo o porta-voz, o que ele afirma se torna discussão em quase todo o planeta.

A falácia do espantalho frequentemente aparece em conjunto com outras falácias lógicas, tornando os argumentos ainda mais enganosos. Algumas falácias que costumam estar associadas ao espantalho incluem:

  • Falsa dicotomia: Apresenta apenas duas opções extremas como se fossem as únicas possíveis, forçando o oponente a escolher entre posições distorcidas.

  • Apelo à emoção: O espantalho pode ser exagerado para provocar medo, raiva ou indignação, desviando o debate racional.

  • Argumento ad hominem: Em vez de responder ao argumento real, o debatedor ataca a pessoa que o defende, associando-a ao espantalho criado.

  • Falácia da culpa por associação: Relaciona uma ideia aoponentemente negativa a um grupo ou indivíduo para desqualificá-la, sem conexão lógica real.

Como Reagir a um Espantalho

Para finalizar este text, vou deixar algumas sugestões de como reagir em casos como esse. Se você se deparar com um argumento espantalho, é importante saber como desmontá-lo de forma eficaz. Algumas estratégias incluem:

  • Pedir Esclarecimento: Pergunte diretamente ao debatedor onde exatamente a posição original foi defendida. Infelizmente, no caso de Trump, não há um oponente à altura, portanto, espera-se que o maior número de pessoas estabeleça a refutação em suas respectivas bolhas.

  • Apontar a Distorção: Mostre como o argumento foi modificado e explique qual é a posição real. Esta questão e fundamental para constranger a mentira.

  • Reformular Corretamente o Argumento: Retorne ao ponto inicial e esclareça a visão correta sobre o assunto. Especialmente aqui, é preciso ser bastante incisivo, principalmente se o debatedor age de má-fé.

  • Exigir Evidências: Peça fontes confiáveis para sustentar as alegações feitas sobre a posição distorcida.

  • Evitar a Armadilha: Não se deixe levar pelo espantalho, mantendo o foco na discussão original.

 

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *